Lygia Fagundes Telles

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"Enriqueço na solidão: fico inteligente, graciosa e não esta feia ressentida que me olha do fundo do espelho. Ouço duzentas e noventa e nove vezes o mesmo disco, lembro poesias, dou piruetas, sonho, invento, abro todos os portões e quando vejo a alegria está instalada em mim."

- Lygia Fagundes Telles, no livro “As meninas”.



"Ser ou estar. Não, não é ser ou não ser, essa já existe, não confundir com a minha que acabei de inventar agora. Originalíssima. Se eu sou, não estou porque para que eu seja é preciso que eu não esteja. Mas não esteja onde? Muito boa a pergunta, não esteja onde. Fora de mim, é lógico. Para que eu seja assim inteira (essencial e essência) é preciso que não esteja em outro lugar senão em mim. Não me desintegro na natureza porque ela me toma e me devolve na íntegra: não há competição mas identificação dos elementos. Apenas isso. Na cidade me desintegro porque na cidade eu não sou, eu estou competindo e como dentro das regras do jogo (milhares de regras) preciso competir bem, tenho consequentemente de estar bem para competir o melhor possível."

- Lygia Fagundes Telles, no livro “As meninas”.



“Gosto de me preparar para escrever. Eu não escrevo de qualquer jeito - de camisola, de pijama. Eu gosto de me arrumar! Escrever é o meu ofício e quero estar arrumada para ele. Dentes escovados, banho tomado, uma roupa, pronto: agora vou trabalhar.”

- Lygia Fagundes Telles (fonte: O Povo 19.04.2013).



“Solução melhor é não enlouquecer mais do que já enlouquecemos, não tanto por virtude, mas por cálculo. Controlar essa loucura razoável: se formos razoavelmente loucos não precisaremos desses sanatórios porque é sabido que os saudáveis não entendem muito de loucura. O jeito é se virar em casa mesmo, sem testemunhas estranhas. Sem despesas.”

- Lygia Fagundes Telles, em "A disciplina do amor".



“Não me agrada ver a mulher agressiva, arrogante, escrava das cirurgias plásticas e da moda. Ah, tanto medo da velhice! Mas o que é isso?”

- Lygia Fagundes Telles, em entrevista a Sonia Racy/ jornal O Estado de São Paulo em 21/12/09. (fonte: Acervo Portal Literal).



“Não acho maravilhoso envelhecer. A gente envelhece na marra, porque não há mesmo outro jeito, já fui a tantas estações de águas, já bebi de tantas fontes – onde a Fonte da Juventude, onde?”

- Lygia Fagundes Telles, em "A disciplina do amor".



"...A minha tiazinha falava muito na falta que lhe fazia esse ombro amigo, apoio e diversão, envelheceu procurando um. Não achou nem o ombro nem as partes, o que a fez chorar sentidamente na hora da morte, Mas o que você quer, queridinha?! a gente perguntava. Está com alguma dor? Não, não era dor. Quer um padre? Não, não queria mais nenhum padre, chega de padre. Antes do último sopro, apertou desesperadamente a primeira mão ao alcance: “É que estou morrendo e não me diverti nada!””

- Lygia Fagundes Telles, em "A disciplina do amor".


“A mesma paixão que nos une: a paixão da palavra. A mesma luta tecida na solidão e na solidariedade para cumprir o duro ofício nesta sociedade violenta, de pura autodestruição. E neste tempo que está mais para Gregório de Matos do que para Pedro Calmon – ah! quanta matéria para a inspiração do trovador com sua viola demolidora. Um tempo que marca a plenitude da sátira, da charge política: a salvação através do humor. Com esse humor incandescente, ele iria se empenhar de novo na denúncia dos males que desde o século XVII já afligiam o País, centralizados na Política com seus demônios crônicos na delirante corrida pelo poder: o demônio da Gula (leia-se voracidade), o demônio da Vaidade e o demônio da Soberba. O burocrático demônio da Preguiça, esse vem se arrastando por último. O duro ofício de testemunhar um planeta enfermo nesta virada do século. Às vezes, o medo. Quando perseguido, o polvo se fecha nos tentáculos e solta uma tinta negra para que a água em redor fique turva e, assim, camuflado, ele possa então fugir. A negra tinta do medo. Viscosa, morna. Mas o escritor precisa se ver e ver o próximo na transparência da água. Tem de vencer o medo para escrever esse medo. E resgatar a palavra através do amor, a palavra que permanece como a negação da morte. Às vezes, a esperança. O homem vai sobreviver, e essa certeza me vem quando vejo o mar, um mar que talhou com tanta poluição, embora! mas resistindo. Contemplo as montanhas e fico maravilhada porque elas ainda estão vivas. Sei que é preciso apostar e de aposta em aposta cheguei a esta Casa para a harmoniosa convivência com aqueles que apostam na palavra. Sei ainda que estou feliz nesta noite: vejo minha família – meu filho Godoffredo Telles Neto deve estar por aí me filmando, é cineasta. E vejo os meus amigos. Esses amigos que me acompanham e me iluminam.”

-Lygia Fagundes Telles, trecho do discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, em 12/05/1987.


"Escrevi que toda minha vida convergia para ele e que era só dele que iria se irradiar de hoje em diante. Quero te dizer também que nós, as criaturas humanas, vivemos muito (ou deixamos de viver) em função das imaginações geradas pelo nosso medo. Imaginamos consequências, censuras, sofrimentos que talvez não venham nunca e assim fugimos ao que é mais vital, mais profundo, mais vivo. A verdade, meu querido, é que a vida, o mundo dobra-se sempre às nossas decisões. Não nos esqueçamos das cicatrizes feitas pela morte. Nossa plenitude, eis o que importa. Elaboremos em nós as forças que nos farão plenos e verdadeiros."

- Lygia Fagundes Telles, no livro “As meninas”.


“Sim, a arte é uma busca e a marca constante dessa busca é a insatisfação. Na hora em que o artista botar a coroa de louros na cabeça e disser, estou satisfeito, nessa hora mesmo ele morreu como artista. Ou já estava morto antes. É preciso pesquisar, se aventurar por novos caminhos, desconfiar da facilidade com que as palavras se oferecem. Aos jovens que desprezam o estilo, que não trabalham em cima do texto porque acham que logo no primeiro rascunho já está ótimo, tudo bem – a esses recomendo a lição maior que está inteira resumida nestes versos de Carlos Drummond de Andrade:

Chega mais perto e contempla as palavras

Cada uma

tem mil faces secretas sob a face neutra

e te pergunta, sem interesse pela resposta

pobre ou terrível que lhe deres

Trouxeste a chave?”

-Lygia Fagundes Telles, “LISPECTOR, Clarice - Clarice Lispector entrevistas”.



Lygia Fagundes Telles (19 de abril de 1918, São Paulo - 03 de abril de 1922, São Paulo). Escritora brasileira. Algumas de suas principais obras: "Ciranda de Pedra" (1954), "Verão no Aquário" (1963), "As Meninas" (1973), “A Disciplina do Amor” (1980), “As Horas Nuas” (1989).