Arthur Rimbaud

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A eternidade

De novo me invade.

Quem? – A Eternidade.

É o mar que se vai

Como o sol que cai.


Alma sentinela,

Ensina-me o jogo

Da noite que gela

E do dia em fogo.


Das lides humanas,

as palmas e vaias,

Já te desenganas

E no ar te espraias.


De outra nenhuma,

Brasas de cetim,

O Dever se esfuma

Sem dizer: enfim.


Lá não há esperança

E não há futuro.

Ciência e paciência,

Suplício seguro.


De novo me invade.

Quem? – A Eternidade.

É o mar que se vai


Com o sol que cai.

- Arthur Rimbaud (1872), em "Rimbaud Livre", introdução e tradução Augusto de Campos.




À volta da mesa, pintura de Henri Fantin-Latour (1872) - Rimbaud é o segundo à esquerda. Ao seu lado direito Paul Verlaine



Canção da mais alta torre

Inútil beleza

A tudo rendida,

Por delicadeza

Perdi minha vida.

Ah! que venha o instante

Que as almas encante.


Eu me digo: cessa,

Que ninguém te veja:

E sem a promessa

Do que quer que seja.

Não te impeça nada,

Excelsa morada.



De tanta paciência

Para sempre esqueço:

Temor e dolência

Aos céus ofereço,

E a sede sem peias

Me escurece as veias.


Assim esquecidas

Vão-se as Primaveras

Plenas e floridas

De incenso e de heras

Sob as notas foscas

De cem feias moscas.


Ah! Mil viuvezas

Da alma que chora

E só tem tristezas

De Nossa Senhora!

Alguém oraria

À Virgem Maria?


Inútil beleza

A tudo rendida.

Por delicadeza

Perdi minha vida.

Ah! que venha o instante

Que as almas encante!

- Arthur Rimbaud (1872), em "Rimbaud Livre", introdução e tradução Augusto de Campos.



Mística

No declive da escarpa, os anjos giram suas roupas

de lã sobre os relvados de ouro e esmeralda.

Prados de flamas saltam até o alto da colina.À

esquerda, o terraço da aresta é pisado por todos

os homicidas e todas as batalhas, e todos os rumores

desastrosos tecem sua curva. Atrás da aresta direita,

a linha dos orientes,dos progressos.

E, enquanto a banda no alto do quadro é formada pelo

rumor giratório e saltitante das conchas marinhas e

das noites humanas,

A doçura florida das estrelas e do céu e do resto desce

da escarpa, como um cesto, - contra nosso rosto,e faz o

abismo florido e azul lá embaixo.

- Arthur Rimbaud, em "Iluminações", introdução, tradução e notas Lêdo Ivo.

“O poeta se faz de vidente por meio de um longo, imenso e refletido desregramento de todos os sentidos”

- Arthur Rimbaud



A estrela chorou rosa...

A estrela chorou rosa ao céu de tua orelha.

O infinito rolou branco, da nuca aos rins.

O mar perolou ruivo em tua teta vermelha.

E o Homem sangrou negro o altar dos teus quadris.

- Arthur Rimbaud, em "Rimbaud Livre", introdução e tradução Augusto de Campos.






Arthur Rimbaud ( 20 de outubro de 1854, Charleville, França -10 de novembro de 1891, Marseille, França). Poeta simbolista, produziu suas obras mais famosas quando ainda era adolescente.